É esse o olhar que você recebe quando sua sogra vê você educando seus filhos? Não sei se isso serve de consolo, mas você não é a única pessoa que passa por isso. Estive visitando uma comunidade do Orkut que criou um tópico somente para discutir a interferência da família de origem sobre a educação dos filhos, e ali podemos ver como o tema é importante para muitas famílias.
Embora aqui eu tenha dado o exemplo da sogra, a bela senhora ao lado bem que poderia ser qualquer uma das avós ou dos avôs de seu filho, pois, quando o tema é educação, podem surgir situações estressantes a partir da relação entre pais, filhos e avós.
"Às vezes dá uma peleia com meus pais, que por eu ser filho único, querem interferir nas minhas decisões, mas eu não arredo o pé. E, por incrível que pareça, me dou melhor com meus sogros do que com meus pais sobre esses aspectos", conta Tom Venderson, de São Borja (RS).
A situação de Márcia (de Curitiba) se complicou bastante pelas interferências de sua mãe: "Minha mãe fez eu chorar ainda no hospital. Os primeiro dias de vida do meu pimpolho me renderam o maior estress com a minha mãe. Meu leite até empedrou de tanto nervoso. E não saía nem com esgotadeira elétrica. Tive mastite e optei por secar o leite. Estava tão dopada com os anti-inflamatórios e outros remédios, que quase não ficava com meu filho. Foi um caos. Até o bebê já estava nervoso. Chorava muito. E ela achava que era cólica por causa do leite. Às vezes, avó atrapalha e o pior é que elas não se dão conta disso e pioram a situação".
Quando o assunto é a relação entre sogra e nora, o clima de rivalidade deve ser evitado ao máximo, pois podem ser abertas feridas difíceis de cicatrizar. É o que se passou com Rúbia, de São Paulo: "Eu morei os nove meses com a minha familia. Quando minha filha nasceu, fui morar com o pai dela e minha sogra. No começo era mil maravilhas, ela era atenciosa, sempre me tratou muito bem. Foi passando o tempo, e ela foi se mostrou quem era reamente. Ela se metia em tudo, dava palpites sem a gente perguntar, falava que a comida que ela fazia era melhor que a minha. Também falava que a minha filha só parecia com a familia dela! Hoje estou separada do meu esposo por causa dela, voltei a morar com meus pais".
Mas felizmente há aqueles que conseguem passar por tudo isso sem maiores traumas. "Nós aceitamos as opiniões e ouvimos todas com atenção, só que a partir do momento que estamos em casa sozinhos, fazemos da melhor forma possível... o mais importante é ouvir as pessoas da família", conta Wagner no Orkut.
É o que se passa também com Brenda, de Salvador: "Tenho uma sogra maravilhosa, apesar de morar longe dela sempre que ela vem em minha casa ou vou passar as férias na casa dela, nos damos muito bem. Ela se meteu apenas uma vez, mas entendi, minha princesinha estava muito mal, com rota virus e tinha apenas 10 meses, e todos ficamos muito preocupados e ela queria dizer o que devíamos fazer para o bebê melhorar, apenas isso. Moro no mesmo condomínio de minha mae, mas ela nao interfere. Vou todos os dias à casa dela pra ela ver a neta, que é a primeira e única neta, por enquanto, e ainda por cima tem o nome dela, então imagine a babação, mas nem ela nem pai são de se interferir, dão algumas sugestoes, mas sempre dizem para eu conversar com meu parido primeiro e ver o que achamos melhor".
Iluminados pelo magistério da Igreja, podemos considerar alguns pontos que auxiliam na solução desse difícil problema familiar.
a) a educação é um dever-direito originário dos pais, não dos avósRecordemos o ensino de João Paulo II, na Exortação Apostólica
Familiaris consortio (n. 36):
O dever de educar mergulha as raízes na vocação primordial dos cônjuges à participação na obra criadora de Deus: gerando no amor e por amor uma nova pessoa, que traz em si a vocação ao crescimento e ao desenvolvimento, os pais assumem por isso mesmo o dever de a ajudar eficazmente a viver uma vida plenamente humana. Como recordou o Concílio Vaticano II: «Os pais, que transmitiram a vida aos filhos, têm uma gravíssima obrigação de educar a prole e, por isso, devem ser reconhecidos como seus primeiros e principais educadores. Esta função educativa é de tanto peso que, onde não existir, dificilmente poderá ser suprida».
O direito-dever educativo dos pais qualifica-se como essencial, ligado como está à transmissão da vida humana; como original e primário, em relação ao dever de educar dos outros, pela unicidade da relação de amor que subsiste entre pais e filhos; como insubstituível e inalienável, e portanto, não delegável totalmente a outros ou por outros usurpável.
Assim, todos, mas todos mesmo (e isso inclui os avós), devem respeitar esse direito que não é só dos pais, mas também das crianças. A não ser em situações mais graves - como, por exemplo, maus tratos -, qualquer comentário ou correção deve ser dirigido aos pais e não às crianças. Espera-se que os anos tenham trazido aos avós a sabedoria suficiente para que possam falar carinhosamente aos pais, respeitando sempre sua autoridade diante das crianças.
É necessário que os avós estejam convictos do seguinte: por maior amor e carinho que têm pelos netos, estarão destruindo sua educação se desautorizarem os pais. Pode ser agradável aos avós a idéia de cumplicidade com as crianças, como um pacto entre elas, no qual passam a permitir aquilo que os pais proíbem. Mas já estão numa fase da vida em que já deviam saber que o agradável nem sempre é o melhor.
b) os pais devem valorizar a vocação dos avósDiante das tensões que o assunto gera, muitos pais optam por uma saída radical: afastam as crianças do convívio dos avós. Foi a alternativa que encontrou Wanessa, de Curitiba. Diz que a sogra infernizou tanto sua vida que tiveram que adotar essa solução: "Hoje eu consegui despistá-la e ela não sabe onde moro, não tem meu telefone... Meu marido me apóia pois sabe a mãe que tem. 1 ou 2 vezes por ano vou à casa dela para levar os netos para ver, mas é visita de médico: mais ou menos meia hora. Não agüento mais que isso ouvindo as baboseiras dela".
Assim como os pais podem sofrer interferência de terceiros em casos drásticos (como os maus tratos), também essa pode ser uma solução plausível em casos que realmente colocam em risco a saúde física ou psíquica das crianças. Mas não se pode utilizá-las como arma de punição contra os avós, simplesmente porque não os toleramos.
Além disso, é necessário que os pais não sucumbam a tendências culturais presentes em muitos ambientes. Hoje, nas sociedades ocidentais, o idoso é cada vez menos valorizado. Numa mentalidade que entroniza a beleza, a eficiência, o prazer, a utilidade, não encontram lugar aqueles que perderam esses atributos ao longo dos anos. É necessário valorizá-los em sua vocação atual de idosos. Os pais devem observar seriamente se acolhem com afeto os avós na vida familiar, procurando fazer com que se sintam úteis e valorizando aqueles dons próprios da ancianeidade.
A esse propósito, também nos lembrava o Papa João Paulo II, na
Carta aos anciãos:
É urgente recuperar a justa perspectiva a propósito da vida no seu conjunto. E a justa perspectiva é a eternidade, da qual a vida é preparação significativa em cada uma das suas fases. A velhice também tem de cumprir o seu papel neste processo de progressiva maturação do ser humano a caminho da eternidade. Desta maturação só poderá beneficiar-se o mesmo grupo social, do qual faz parte o ancião.
Os anciãos ajudam a contemplar os acontecimentos terrenos com mais sabedoria, porque as vicissitudes os tornaram mais experimentados e amadurecidos. Eles são guardiões da memória colectiva e, por isso, intérpretes privilegiados daquele conjunto de ideais e valores humanos que mantêm e guiam a convivência social. Excluí-los é como rejeitar o passado, onde penetram as raízes do presente, em nome de uma modernidade sem memória. Os anciãos, graças à sua experiência amadurecida, são capazes de propôr aos jovens conselhos e ensinamentos preciosos.
Sob esta luz, os aspectos de fragilidade humana, ligados de modo mais visível com a velhice, tornam-se uma chamada à interdependência e à necessária solidariedade que ligam entre si as gerações, visto que cada pessoa está necessitada da outra e se enriquece dos dons e dos carismas de todos.
Assim, privar as crianças do convívio de seus avós pode levar à privação do sentido de eternidade e do sentido de solidariedade, de interdependência, de valorização do outro pelo que é e não pelo que pode produzir. Como é importante para as crianças ouvirem as histórias contadas por seus avós!
Por outro lado, temos a questão da coerência: queremos que nossos filhos nos respeitem? Demos o exemplo, mostrando-lhes como respeitamos nossos próprios pais. Lembremos que as palavras convencem, mas os exemplos arrastam. Ou um dia seremos desmentidos, chamados de incoerentes. E será verdade!
De mais a mais, é um ledo engano dos pais acharem que, afastando os avós, conseguirão educar seus filhos conforme todos os seus valores. Isso porque toda a sociedade influencia na formação da pessoa: os amiguinhos trazem outros valores de suas famílias, as babás, as creches, a televisão, os amigos dos pais...
c) a comunhão conjugal como força centrípeda na educação dos filhosA unidade na educação é importantíssima. Se não conseguimos fazer com que os avós ou outras pessoas que influenciam nossos filhos comunguem conosco dos mesmos valores em termos de educação, temos que nos esforçar por outra coisa, talvez ainda mais desafiadora:
pai e mãe devem, esses sim, ter uma clara unidade na educação, de forma que os filhos percebam isso. Muito pior que a intromissão dos avós me parece ser a falta de critérios comuns entre os pais, um permite e o outro nega, um faz e o outro desautoriza. O relacionamento do casal deve ter uma força centrípeda tal que faça com que os filhos percebam claramente quais as orientações que devem ser seguidas.
Enfim, e já encerrando, em grande medida o tema implica em aprofundarmos (pela reflexão e pela oração) no sentido do mandamento "Honrar pai e mãe". É o primeiro mandamento que se dirige à relação do homem consigo mesmo e com os demais. É o único mandamento ligado a uma promessa. Dirige-se em primeiro lugar aos filhos em sua relação com seus pais. Mas também implica um dever de todos honrarem a paternidade e maternidade, e daí respeitarem a autoridade que dela provém por disposição divina.