Neste dia 30 de agosto, a Folha On Line publica artigo do filósofo Hélio Schwartsman com o título Lei e preconceito. Gostaria de fazer uma apreciação crítica a respeito do artigo.
Leia Mais...O trecho que eu gostaria de destacar é o seguinte:
O que dois ou mais adultos fazem consensualmente entre quatro paredes em matéria de sexo é assunto que diz respeito apenas a eles. Desde que em comum acordo e sem envolver menores, não há nada de intrinsecamente errado com homossexualismo, masoquismo, sadismo, voyeurismo, fetichismo, coprofilia, zoofilia (se o animal em questão não se opuser) e nem mesmo com a vida monástica escolhida por alguns. Se há algum comportamento reprovável do ponto de vista da boa convivência democrática, ele está, não no homossexualismo ou naquilo que a psiquiatria designa como parafilias, mas no desejo incontido de tentar controlar a sexualidade alheia.
E, se é justo que casais heterossexuais possam herdar os bens um do outro, estabelecer vínculos previdenciários e adotar crianças, não há nenhuma razão para deixar de estender esses mesmos direitos a pares do mesmo sexo. Um cidadão é um cidadão independentemente do lado pelo qual prefira copular.
Trata-se de uma postura liberal radical por parte do autor, que vai na linha da forte presença atual do relativismo ético, para o qual a moralidade de qualquer comportamento deve ficar confiada à liberdade individual de cada um, conforme a sua consciência.
Ao ler o texto, não pude deixar de me lembrar do caso do "Canibal alemão" em 2003. Vocês podem ver uma matéria a respeito clicando aqui, mas apenas para lembrar:
Armin Meiwes e Bernd-Jurgen Brandes (dois homens), realizaram uma fantasia sexual: Meiwes cortou o pênis de seu amante, flambou o membro e os dois comeram juntos. Por causa da hemorragia, Brandes morreu, foi dissecado e comido por Meiwes, e tudo isso com pleno acordo de vontade entre ambos. Em sua defesa, Meiwes alegou justamente que tudo tinha sido feito em plena liberdade, o que lembra justamente o pensamento do filósofo da Folha On Line quando afirma que não há nada de intrinsecamente errado em matéria de sexo quando feito consensualmente entre quatro paredes.
Diga-se de passagem que a defesa de Meiwes foi bem sucedida: o Ministério Público alemão pediu prisão perpétua, a defesa pediu a desqualificação para "homicídio a pedido", tipo cuja pena é de 5 anos. O acusado foi condenado a 8,5 anos, sendo que em 5 anos já poderia estar em liberdade (ou seja, no ano que vem). Veja essa outra notícia a respeito.
Hélio Schwartsman estaria correto ao afirmar que não existe nada de intrinsecamente errado em qualquer tipo de comportamento sexual, incluindo coprofilia e zoofilia? Apenas para esclarecer: coprofilia é a excitação sexual pelo contato com as fezes do parceiro, incluindo aí a coprofagia (ingestão); zoofilia é a prática de sexo com animais.
A maioria das pessoas, creio eu, diria que tais comportamentos são em si mesmos desordenados, portanto intrinsecamente errados. Mas se perguntássemos quais seriam os critérios objetivos para avaliar se um comportamento é ou não errado do ponto de vista moral, nossa mentalidade relativista teria muita dificuldade para responder.
Por trás de tudo isso, penso haver uma perda do sentido do homem. Quem é o homem? Quem sou eu? Qual o sentido da minha existência? São perguntas-chave para termos critérios objetivos para lidar com tais questionamentos. Acredito, pois, que devemos procurar uma antropologia ontologicamente fundada para termos motivos reais, objetivos, racionais, para avaliar a moralidade dos atos humanos.