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07 fevereiro 2007

A exposição das crianças à propaganda


Acabo de ver na TV um anúncio de uma boneca, que termina dizendo: "Você pode. Você é Susi".

Aqui em casa, nem os avós do meu filho estão autorizados a dizer o que ele pode ou não pode ganhar, sem que eu e minha esposa tenhamos autorizado. Como é que um anunciante, no intervalo de um programa dedicado a crianças, entra em minha casa, dirige-se diretamente ao meu filho sem me consultar, e diz para ele "você pode"?! A mensagem de que "você pode" ou que não pode, não deveria ser dada pelos pais? O anunciante, ao dar esse "comando" à criança, não está agredindo o direito dos pais?

Não é a primeira vez que um anúncio desrespeita os direitos da família. Há alguns anos, um anúncio de um caminhãozinho, na mídia impressa, tinha a seguinte legenda: "é só falar que ele acende os faróis, liga o motor, anda, toca buzina e atropela sua mãe se ela não te der um"(!) (Conar, Representação nº 218/92)

Eis um dos motivos que me fazem pensar tanto no tema dos direitos da família! A propaganda direcionada ao público infantil é objeto de permanente preocupação para tais direitos. Mas quem nos defende contra os abusos?

Existe o Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária - Conar, mas não creio que este seja de fato o melhor caminho para a defesa dos direitos da família. É formado por entidades ligadas à propaganda e não tem poder para punir, uma vez que se trata de mera sociedade civil. Essa associação possui um Conselho de Ética formado por consumidores, anunciantes e outros segmentos, que procura aplicar o chamado Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária. Apesar do nome de "Código", não se trata de uma lei com força impositiva, mas apenas de um conjunto de normas de caráter privado, criado por algumas entidades privadas (Associação Brasileira das Agências de Propaganda, Associação Brasileira de Anunciantes, Associação Nacional de Jornais, Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, Associação Nacional de Editores de Revistas). Sendo assim, as sanções ali previstas só são impostas a quem aceita a imposição. E tais sanções se limitam a advertir, recomendar ou manifestar a posição do CONAR sobre tal propaganda. Nada mais.

A falta de controle efetivo sobre a propaganda direcionada às crianças faz surgir propostas de regulamentação mais incisivas. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, foi proposto o Projeto de Lei nº 5921/91, de autoria do Dep. Luiz Carlos Hauly, que incluiria um artigo ao Estatuto da Criança e do Adolescente para proibir toda e qualquer propaganda direcionada ao público infantil. Embora tenha sido aprovado três vezes pela Comissão de Defesa do Consumidor, foi arquivado em 31/01/2007 porque terminou a legislatura passada (é a regra do Regimento Interno da Câmara).

Enquanto nada muda, cabe a nós educarmos nossos filhos para o consumo e para o correto discernimento diante dos meios de comunicação social. Se o ambiente cultural é agressivo e dificulta nossa tarefa, creio que seja o momento de pensarmos mais seriamente na associação de famílias. Seria um caminho interessante para fazer com que a voz dos pais de família fosse realmente ouvida nos diversos âmbitos públicos. Já comentei isso em outro tópico, dando inclusive algumas referências de sites para os interessados no tema.

Para outras abordagens, sugiro as seguintes leituras:

1. Propaganda e crianças
2. Ingenuidade e recepção: as relações da criança com a TV
3. A criança é a bola da vez

2 comentários:

  1. Que saudade da propaganda do Cremogema, cujo slogan era: "A mamãe quer sempre o melhor pra gente: Cremogema"!

    Que diferença de comportamento dos anunciantes! E era uma propaganda super-eficaz, porque até hoje (lá se vão 30 anos), lembro-me da letra, da melodia e das imagens da propaganda.

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  2. O conceito tradicional do marketing é que é ele quem "vende" os produtos. Repare como próximo ao dia das crianças, os canais infantis da TV paga bombardeiam as crianças com os mais inúteis brinquedos.

    Hoje em dia a propaganda busca apelar pelos sentimentos individuais, ou seja, onde a pessoa é levada a tomar uma decisão (comprar) e se sentir melhor pelo ato e nem tanto pelo produto. A gente vê isso muito no mundo dos refrigerantes (em especial os light). A tônica é do tipo: Você é super, você pode comprar! Tome uma atitude!

    Também dá saudade do cremogema...

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